Quem tem medo da geopolítica?
Leonel
Itaussu Almeida Mello
Carolina Schroeder e Paulo Henrique Cancian
O autor tem como objetivo principal
do livro responder seguinte questão: “Em que medida permanece atual ou
tornou-se obsoleto, nestes últimos anos do século XX, o pensamento geopolítico
de Mackinder? (Mello, 1999, p.25)” Para isso, ele parte de uma releitura da
obra de Mackinder, analisando sua teoria do poder terrestre que se resume na
existência de uma “rivalidade secular entre (...) poderes antagônicos que se
confrontavam pela conquista da supremacia mundial: o poder terrestre e o poder
marítimo (Mello, 1999, p.11)”.
Segundo Mello, os três pilares dessa
teoria são: a idéia do mundo como unidade compacta; o primado da causalidade
geográfica; e a oposição terra-mar. Mackinder, após uma reelaboração
intelectual, chega a uma “percepção inédita” da ligação entre a porção líquida
e sólida do planeta. Ele compreendeu que existia uma “unicidade da superfície
líquida” o que o levou ao conceito de Grande Oceano. As terras emersas
restantes formavam um único grande continente que ele denominou de Ilha Mundial
(Europa, Ásia e África) e as Ilhas Periféricas menores (Américas e Austrália).
Surge também o conceito de Heartland que denomina o grande núcleo
mediterrâneo da Eurásia, “(...) em torno do qual se articulavam quatro regiões
marginais: a Europa, o Oriente Próximo, a Índia e a China. (Mello, 1999, p.43)”.
Segundo Mello, o Heartland é uma idéia estratégica com três características
essenciais: região mais extensa de planícies do planeta; praticamente isolada
do mundo; e com topografia plana. Mackinder sintetiza esse axioma do pensamento
geopolítico: “Quem domina a Europa Oriental controla o Heartland; quem domina o Heartland
controla a World Island; quem domina
a World Island controla o mundo
(Mello, 1999, p.56)”.
O autor passa, então, a analisar a
relação existente entre geopolítica inglesa, Geopolitik alemã e a política externa do III Reich. A influência de
Mackinder sobre Haushofer é claramente exposta na visão desse sobre a
importante relação entre Rússia e Alemanha. Porém, a influência de Haushofer
sobre a política de poder de Hitler é “extremamente difícil” de se demonstrar.
Segundo Mello, Hitler e Haushofer tinham concepções antagônicas sobre a
política de aliança alemã no que diz respeito à Inglaterra e a Rússia (Mello,
1999, p.88).
A investigação das influências de
Mackinder é deslocada para dois
destacados expoentes da geopolítica norte-americana: Nicholas Spykman e
Zbigniew Brzezinski. Spykman é o “formulador da teoria do Rimland, e percursor da estratégia de contenção do pós-guerra”
(Mello, 1999, p.26). O Rimland,
segundo o próprio Spykman, deveria ser visto como região intermediária situada
entre o Heartland e os mares
marginais. Ele funcionaria como uma “vasta zona amortizadora” entre os poderes
marítimo e terrestre, apresentando, ainda, uma característica anfíbia que lhe
permitiria se defender em terra ou em mar.
Spykman contraria baseado em fatos da história
a concepção global de Mackinder sobre a rivalidade entre o poder terrestre (Heartland – Rússia) e o marítimo (Ilhas
costeiras – Inglaterra). Segundo ele, o que ocorreu durante as guerras foi
justamente uma aliança entre os impérios. Mello chama a atenção para os indícios
de que a essa oposição entre Heartland -
Rimland foi fundamental para visão geopolítica e estratégica dos pactos
militares multilaterais no auge da Guerra Fria, por exemplo, a Otan.
Brzezinski, outro importante
geopolítico estadunidense, foi autor do Game
Plan, uma análise realista da confrontação americano-soviética. Segundo
Mello, o autor desenvolve uma reflexão geopolítica e estratégica que através de
um modelo sintético incorpora os principais aspectos das teorias do Heartland e do Rimland, pois, sua tese de que controlar a Eurásia é ter
preponderância mundial não é nada original. Na visão de Brzezinski, um mapa
pode tanto enganar como iluminar, portanto, “(...) o espaço e a posição
relativa das massas continentais dependem sempre do tipo de projeção adotada”
(Mello, 1999, p.141). A confrontação americano-soviética, segundo Brzezinski,
apesar de, ter novos atores se resumia no velho choque entre uma potência
oceânica e uma potência continental.
Mello faz uma conexão entre
Mackinder e o término do “Breve século XX”. Desse capítulo, é importante
destacar a idéia de que com o fim do sistema bipolar tem-se a terceira vitória
do poder marítimo sobre o poder terrestre ao longo do século. Além disso, é
interessante o trecho onde Mello destina a China como a “única potência
continental fronteiriça” com capacidade de ocupar o Heartland.
Por fim, o autor responde a pergunta
que, segundo ele, representa a razão deste livro. Para Mello, o pensamento de
Mackinder é atual em certos aspectos, mas obsoleto em outros como: quanto à
evolução da cartografia – descoberta da projeção azimutal eqüidistante que
“permite fixar arbitrariamente seu centro de referência em qualquer ponto do
planeta” (Mello, 1999, p.197); e quanto ao avanço da tecnologia – “ascensão do
poder aéreo que relativizou a oposição oceanismo versus continentalismo” (Mello, 1999, p.211).