Música
dramática. Em um grande plano, a câmera mostra uma cidade. Durante um longo
instante nossos olhos nos enganam, mas aos poucos, conforme a câmera sobrevoa a
imagem, nossa mente percebe o que está errado, a grande cidade revela-se um
amontoado de móveis. Os móveis do magnífico senhor Charles Foster Kane. A
cidade do magnífico senhor Charles Foster Kane está em chamas. “Jogue este
lixo”. Assim termina Cidadão Kane.
O pequeno Kane veio de família pobre, mas ainda criança, após os
pais receberem uma mina de ouro, supostamente sem valor, como pagamento, passou
a ser criado por um banqueiro multimilionário. Na juventude, herdou um grande
patrimônio em ações, imóveis e outros bens. Entre estes bens estava um pequeno
e falido jornal, The Inquirer, que serviu como meio de manipulação para o
idealista Kane. Depois de uma reformulação completa o jornal se torna
influente, principalmente pelo sensacionalismo, dado às notícias. Com isso,
Charles torna-se conhecido no país inteiro e passa a gozar de grande reputação,
sobretudo entre a população pobre. Kane tenta entrar na política,
candidatando-se ao Governo do Estado de Nova York de forma independente; só não
vence por conta da descoberta de um escândalo amoroso, o “caso” de Kane com a
cantora Susan Alexander, que mais tarde se tornaria sua segunda esposa – a primeira
havia sido a sobrinha do presidente dos EUA, Emily Norton.
Com o passar dos anos, o magnata vai se tornando uma pessoa cada
vez mais rude, hostil e solitária. Vivendo em um palácio tão suntuoso quanto
frio, com dezenas de esculturas e quadros caríssimos, Kane definha ao lado de
sua mulher, Susan, que, cansada do marasmo do lugar e da frieza do marido,
resolve abandoná-lo, o que foi o golpe de misericórdia para um homem cercado de
pessoas, mas, na verdade, abandonado por todos.
O que afinal vale a vida de um homem?
Kane tinha tudo que um homem pudesse querer: dinheiro, poder,
mulheres, diversão. Nada disso, porém, parecia preencher o vazio que Charles
sentia. Ele sempre queria mais, afetava a todos que o cercavam com a sua
ganância. Por isso, a imagem da cidade no final do filme é tão significativa,
uma vez que ela nos mostra o mundo de Kane, o grande orgulho do magnata, a
cidade dentro do palácio Xanadu, sendo estraçalhada e queimada após a morte do
fundador. Uma cidade sem significados para qualquer um, mas que representava a
existência de um homem. De um homem vazio e solitário, que precisou da sua
própria cidade, do seu forte, para sentir-se seguro. Essa imagem traduz o drama
de Kane de um modo tão forte que o espectador se revolta e se emociona com o
protagonista. Com o pequeno Charles, com o grande Kane.